Hoje volto ao meu universo mais querido: ao sistema de saúde.
À arquitetura do mais importante sistema de suporte social do país.
Do navio almirante SNS, aos privados e, principalmente, à tentativa sucessiva de reformar o sistema de saúde para melhor servir os cidadãos.
Esta conversa com Correia de Campos, Professor, antigo ministro da saúde, primeiro autor do livro branco da saúde, dura há exatamente 30 anos.
Desde 1993 que lhe faço perguntas e tento aprender com as suas respostas.
Nem sempre lhe fiz perguntas simples e nem sempre recebi respostas doces.
Mas a conversa ao longo dos anos foi sempre útil.
Quão difícil é fazer reformas na saúde em Portugal?
Será possível que algum ministro ou ministra sobreviva politicamente mais do que os dois anos e pico da praxe na pasta da saúde? Com um par de exceções conhecidas.
A área da saúde é das mais visíveis, importantes e sensíveis da nossa vida coletiva.
Todos vamos tolerando os atrasos nos tribunais, a má adaptação da escola à vida real ou a tirania das finanças na nossa vida, mas quando o assunto toca a saúde a música é diferente.
Recorremos habitualmente à saúde em situação de vulnerabilidade. Quando estamos doentes. Quando estamos feridos. Quando corremos risco de vida.
E nestas circunstâncias — nossas ou de familiares e amigos próximos — a nossa tolerância e paciência são mínimas.
Reformar um sistema aberto 24 horas por dia, 365 dias por ano, distribuído pelo país, que custa 15 mil milhões de euros, pagos pelos contribuintes, fora os extras de cada cidadão, os seguros e a ADSE, é difícil.
Poderia dizer, quase impossível.
Esta conversa de hoje tem como pretexto um livro que Correia de Campos escreve.
Ele tem o bom hábito de escrever livros a prestar contas, a explicar contextos e a abrir pistas para o futuro.
O livro tem o título provocador de : “A gaveta de reformas”.
Numa interpretação livre podemos ler aqui que as gavetas podem guardar muitas reformas. Reformas metidas na gaveta. Ou reformas tiradas da gaveta.
Cada um que decida.
A mim sempre me fascinaram os estrategas, decisores, administradores e servidores da causa pública da saúde.
Deixo uma reflexão muito pessoal. Estas pessoas passam anos a pensar e desenhar soluções para resolver os problemas dos cidadãos. Em particular dos doentes.
E depois preparam-se para tomar decisões. O melhor, entre várias opções. O menos mal. O melhor custo-benefício e outras tantas árvores de decisão.
Portanto, estudam muito e sabem decidir. O melhor que podem e sabem.
Mas no terceiro pé são menos competentes: na comunicação.
Não, não falo de técnica ou sequer de transparência.
Estou a falar sobre não incluir os cidadãos, a audiência e as suas expectativas no processo de comunicação. E antes disso, no processo de estudo e decisão.
Sim, todos sabemos que a economia conta muito. Os recursos limitados. As necessidades infinitas.
Mas um bom sistema de integração do cidadão no processo de decisão, numa medição das suas expectativas e num envolvimento na comunicação dariam uma grande ajuda.
EstaEstá dado o meu contributo para a gaveta dos comunicados das reformas da saúde.
Vamos ler o livro?
Entretanto, vale anotar:
Os ganhos em saúde são notáveis e crescentes.
Mas muita coisa há que fazer.
E a expectativa dos cidadãos é elevada.
Será que os estudos sociológicos e psicológicos do sentimento da população não poderiam começar a ser parte do processo de decisão?
E as ferramentas de audição dos utentes?
Até podíamos ir mais longe: convidar cidadãos a ocupar lugares executivos ou consultivos nos centros de decisão.
Assim as decisões seriam mais nossas.
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